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sábado, 26 de fevereiro de 2011

“Eu pensei a vida não presta ela não gosta de mim” - Leo Jaime [Texto]

Leo Jaime





“Eu pensei a vida não presta ela não gosta de mim”


http://cemiteriodaspalavrasperdidas.blogspot.com/2009/07/anos-80-uma-musica-nostalgia-de-uma.html



Dramas adolescentes, aquele tipo de sensação bem característica como a leve e intensa sensação de carregar o mundo nas costas, aliada sempre à dor do desprezo, um imenso vazio que germina na alma... Algumas vezes uma simples música, mais do que servir de consolo, traz as respostas em meio a tamanhos anseios.

Muitos dirão que sou completamente insano e me utilizo de argumentações um tantinho infundadas também! Isso por afirmar que é mais difícil ser criança ou adolescente do que posteriormente aderir à fase adulta, mesmo em meio a todas as responsabilidades intrínsecas no mundo amadurecido, totalmente clarividente e desprovido da tal ingenuidade. Ainda assim é um mundo mais concreto e linear, enquanto o período antecessor se apresenta como um ocioso universo paralelamente ambíguo, real, misto, psicodélico e condensado a fantasias, às vezes sanguinolentas, repleto de indecisões , dúvidas que permeiam, verdadeiros “aborrecentes” como diriam as mães.
Certamente e sem medo de errar, afirmo que foi a pior fase de minha existência e talvez a que sinta maior saudade, nostalgia sem fim que invade a mente e corrompe a alma em algumas noites e todo esse punhado de lembrança está diretamente atrelado a uma simples poesia cantada, que ajudou a romper o pragmatismo fogoso, obsoletos paradigmas impetuosos, maldade solta pelo ar, com aquela perspicácia exacerbada, a liberar um grito inconsciente que emerge sem cessar, na inconstante busca por respostas e eis que uma simples canção, mais do que retratar esse enredo fatídico, pode trazer as respostas que tanto se carece.

“Você vai de carro pra escola/e eu só vou a pé/ você tem amigos à beça/ e eu só tenho o Zé...”



Não há qualquer demasia em assegurar que Léo Jaime talvez tenha sido o compositor que, com suas letras simplórias, na proposta de um texto coeso e direto, melhor tenha abordado as verdadeiras agruras das minhas e outras tantas adolescências, dentro de uma unidade temática que exalta os conflitos daquela geração anos 80. Basta ouvir Leo a entoar os versos da canção “A vida não Presta” para o imediatismo remeter a um garoto matriculado em um colégio particular, durante boa parte da década. O garoto em questão é esse mesmo que se apresenta como humilde escriba. Tanto naquela época quanto hoje não distinguia como grande conquistador, para ser bastante honesto, passava, aliás, consideravelmente longe disso.


Antes de prosseguir, sou obrigado a me defender por mero inoportuno. Não me caracterizava e tão pouco fui incluído entre os mais feios. Embora nenhuma delas jamais me elegeu para figurar entre os bonitões do colégio. Apesar das medidas ligeiramente avantajadas, também como se diz popularmente não era de se jogar fora e até reunia algumas características que, teoricamente, poderiam chamar a atenção das espevitadas e sempre regurgitadas meninas. Meus olhos admiram só de lembrar, loiras, morenas, magras ou gordas, algumas um tanto altas, outras baixas também, ufa!, como todo bom rapaz, ficava aturdido por toda saúde da estereotipia feminina.

Meu perfil englobava necessariamente um clichê mais espirituoso, certas horas pessimista, fugas, prepotente e levemente arrogante. Costumava marcar meus pontos na hora dos debates em sala, não pelo conhecimento aliada a inteligência e sim pela visão soturna das coisas. Coisa essa de quem já tinha o futuro escrito, estava mesmo fadado a ser jornalista: adorava dar meus palpites em tudo, às vezes sem saber ou entender necessariamente de nada. Muito questionador, sempre odiei os repetitivos temas de redação, desde quando nasci já andava com o saco cheio de - ano após ano -escrever sobre as férias.

Hoje, vejo-me com a súbita ânsia do desejo de por um mero instante voltar ao tempo e escrever no lugar daqueles escritos infames uma dissertação sobre essa música e sua influência nesse período da minha história. Não existe ainda uma forma de retomar o passado, então aqui estou a fazer o que devia ter tentado há uns 15 anos. Até consigo traçar o perfil da tal obra, na verdade uma ficção dramatizada com ecos de veracidade, imprimindo minha decadente visão precocemente apaixonada pela vida a respeito de minhas frustrações, chacina adolescente que culminava minha alma, repleta de supostos predicativos como subversivo, espirituoso e com uma pseudo-inteligência dotada da infâmia de se viver, mesmo que utilizando “os meus poderes para o mal”.



“Eu pensei a vida não presta/Ela não gosta de mim”. As musas se sucediam e passavam há ocupar cada dia mais espaço nos pensamentos do garoto timidamente inocente, aventurando-se por um mundo novo, a romper os muros dos labirintos da conquista, convivendo sempre com a iminente ameaça da derrota...Pedia aos ventos para te soprar meu beijo e te contar que te amo, você é simplesmente o meu maior desejo. Os intervalos do colégio era o momento perfeito para interagir, dedicar-me a amores imperfeitos, o possível deveramente improvável, dentro de uma lógica completamente ilógica, complexo despautério atormentando cada segundo existente, até nos dias e horas mais impróprias... ”Quantas noites em claro eu passei, tentando te esquecer. Quando à noite eu consigo dormir, eu sonho é com você...A me dizer: Prá não ter ilusões que entre nós não pode ser E é mesmo assim Nem mesmo no meu SONHO Eu posso ter você prá MIM...”, a retratação veemente!


Apesar disso, nem tudo era feito apenas de derrotas, às vezes a pessoa certa - bem ao senso comum – podia estar bem ao seu lado, bem imperceptível, no entanto lutando para ser vista não sendo sempre necessário escalar o castelo de greiscow ou pendurar uma melancia na cabeça para conquistar um mínimo de atenção... Isso ocorreu naquela espécie de encontro arranjado, dentro de um cenário essencialmente brega, que servia de pano de fundo para as minhas desventuras no mundo da conquista. Até que, embalado pela empolgação de um amigo – doido para conquistar a amiga da gatinha – eu a convidei para um cineminha em uma tarde qualquer – tenho a menor ideia quanto à data.

Um detalhe impertinente, o tal amigo bancou os ingressos. Ela era uma garota qualquer, conversávamos sempre nos intervalos, feinha com aquele óculos enorme e a cara cheia de sardas... Não sei se eram meus olhos ou a ânsia de finalmente me “dar bem”, a garota parecia irresistível naquela tarde, o patinho feio tomou forma de ave fênix e fez sua beleza resplandecer do lado escuro de sua horripilância, oferecendo lugar a uma figura atraente, repleta de atrativos e talvez até muito mais ousada.

No Cine vazio, poucas palavras, um atípico jogo com jeito de 0 a 0 até que, lá pelos 40 minutos do segundo tempo de uma batalha modorrenta, resolvi tomar uma atitude hiper ousada. Posicionei-me estrategicamente e pousei a mão espalmada em um dos lugares da moça que mais me chamavam a atenção, vocês até já imaginam o qual, certo? A esperada bofetada finalmente... não aconteceu! Lembro bem, a euforia só não foi total porque, cinco ou dez minutos depois, notara que segurava, com todo o carinho do mundo, suas delicadas mãos. Olho para o lado e vejo que o amigo, que chegara ao cinema como franco-atirador, completamente atracado à morena, sucumbidos a uma louca vontade de arrancar pedaços um do outro. Isso até me serviu de inspiração, enchendo os brios e enfim uma tentativa, logo um beijo aconteceu. Ainda lembro de passar pelo constrangimento de ouvir: “Pensei que não ia tentar nunca”.

Com as garotas, nenhuma mudança radical mas, “A vida não Presta”de Leo Jaime gera o perfeito tom da minha discrepante biografia amorosa. É realmente tenebroso sentir novamente a força dos hormônios não aproveitados. Uma lágrima na escuridão, hoje perdida, mas que ainda insiste em escorrer pela face, trazendo dor e lamento, exorcizando demônios, pesadelos da infância, onde se concentra a dor do meu mundo. Não foram poucos os que disseram que o amor sempre nos leva a algum lugar...Apenas devo confessar que dá saudade lembrar de uma época em que um beijo no cinema representava uma grande conquista pessoal, uma verdadeira epopeia de dramaticidade juvenil, que ainda seduz e eternamente me encanta, mesmo que a VIDA não preste e ela não goste 
de MIM.


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